A evolução do Open Finance, suas oportunidades e desafios legais | Colunas


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Em um mundo cada vez mais digitalizado e interconectado, as mudanças no setor financeiro são inevitáveis. Testemunhamos avanços tecnológicos que estão modificando a maneira como as pessoas lidam com as suas finanças. E é nesse cenário que surgiu o Open Finance, uma extensão lógica do conceito de Open Banking, que ganhou destaque ao redor do mundo na última década. O ecossistema abre uma janela de oportunidade extraordinária para o crescimento de players emergentes, como as fintechs – empresas do setor financeiro que usam tecnologia para criar novos modelos de negócios. No entanto, é essencial que essas empresas invistam em capacitação para atender aos requisitos tecnológicos, regulatórios e de segurança de dados exigidos pelo mercado.

No contexto brasileiro, o advento do Open Finance representa um grande marco no Sistema Financeiro Nacional ao permitir o compartilhamento padronizado de dados, transações e serviços entre instituições financeiras e assemelhadas. O projeto mudou de nome em 2022 para evidenciar a sua maior abrangência, que inclui não somente informações sobre produtos e serviços financeiros tradicionais (como contas correntes e operações de crédito), mas também dados importantes da vida financeira das pessoas (investimentos, câmbio, seguros e previdência). Apesar da mudança de nomenclatura, todos os requisitos de segurança permanecem e o consumidor mantém o controle sobre os seus dados, decidindo se quer ou não compartilhar suas informações.

O Open Finance está sendo implementado em conjunto pelo Banco Central do Brasil (BCB) e o Conselho Monetário Nacional (CMN) por meio da Resolução Conjunta nº 01, de 4 de maio de 2020, que estabelece as diretrizes iniciais para o desenvolvimento do Open Finance no país.

O marco inicial da implementação do Open Finance ocorreu em 1º de fevereiro de 2021, abertura da fase conhecida como Open Data, com o compartilhamento de informações básicas das instituições participantes. Essa etapa inicial representou um passo importante na direção de um sistema financeiro mais transparente e amigável para os consumidores.

Na segunda fase, que teve início em agosto de 2021, houve um avanço significativo em sua abrangência, com o compartilhamento de dados dos próprios clientes, incluindo informações sensíveis (dados cadastrais, saldo/extrato bancário, informações de crédito, etc.). Essa talvez tenha sido a fase que gerou maiores discussões e inseguranças no mercado. No entanto, é fundamental destacar que o compartilhamento ocorre apenas com o consentimento explícito dos clientes das instituições participantes.

Entre março e dezembro de 2022, o BCB contabilizou mais de 18,7 milhões de consentimentos ativos, evidenciando um aumento de 95% em relação ao primeiro semestre do ano de 2022, o que demonstra a crescente aceitação do sistema pelos clientes.

Em 29 de outubro de 2022, a terceira fase, que teve início com as transações de pagamento via Pix, ampliou ainda mais o escopo do Open Finance, incluindo o compartilhamento de serviços financeiros, como pagamentos e encaminhamento de propostas de crédito. Em fevereiro de 2023, passou a ser permitido fazer agendamentos únicos de Pix por meio do ecossistema Open Finance.

Finalmente, em 29 de setembro de 2023, entrou em funcionamento a última das quatro fases de implementação do Open Finance, intitulada Open Investment. Nesta fase, os clientes das instituições participantes podem compartilhar seus dados referentes a produtos e serviços de câmbio, seguros, previdência e investimento com outras instituições que também fazem parte desse ecossistema. Essa iniciativa visa aumentar a transparência e a interoperabilidade no setor financeiro, proporcionando aos clientes mais opções e controle sobre a gestão de seus recursos e, consequentemente, sobre seus investimentos.

Além de todos esses avanços e benefícios para os clientes, é importante destacar que o Open Finance tem um impacto positivo tanto para os bancos tradicionais quanto para as fintechs (especialmente as fintechs de crédito). A maior abertura de dados e a interconectividade proporcionadas pelo Open Finance tendem a criar ambiente favorável para a inovação e a colaboração, permitindo que todos os participantes contribuam para a evolução do setor financeiro, atendendo às diversas demandas e preferências dos clientes.

À medida que o Open Finance avança, fintechs de crédito e outras instituições financeiras se deparam com desafios operacionais e legais complexos que demandam assessoria jurídica e financeira especializadas. No entanto, tais desafios também representam oportunidades para inovação e melhorias, abrangendo áreas cruciais como proteção de dados, proteção dos direitos do consumidor e conformidade com a regulamentação do BCB e CMN.

A conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que inclui a adesão regulatória robusta e medidas eficazes de cibersegurança, é essencial para as instituições financeiras, incluindo as fintechs, não apenas para mitigar riscos legais e multas substanciais, mas também para construir a confiança dos clientes. No que tange ao direito do consumidor, ao cumprir suas obrigações contratuais, estabelecer políticas de crédito transparentes e termos e condições alinhados com o Código de Defesa do Consumidor, as instituições participantes (incluindo as fintechs) não apenas reduzem reclamações e litígios, mas também constroem uma sólida reputação, impulsionando seu crescimento e sucesso a longo prazo.

Por fim, o rigoroso cumprimento das regulamentações e normas estabelecidas pelo BCB não apenas garante a continuidade das operações, mas também fortalece a confiança junto aos clientes e investidores. Portanto, é fundamental que as instituições participantes compreendam plenamente suas obrigações regulatórias, mantenham estrita conformidade com elas e estejam preparadas para adaptar suas práticas operacionais à medida que as regulamentações evoluem.

O ecossistema do Open Finance atualmente abriga mais de 800 instituições participantes, de mais de 150 conglomerados, sendo 13 mandatórios, divididos em 11 associações. Esse cenário impulsiona a revolução em curso no cenário financeiro brasileiro, com as fintechs de crédito desempenhando um papel central na condução dessa transformação por meio do Open Finance. Atualmente, existem mais de 40 milhões de consentimentos ativos para compartilhamento de dados no âmbito do Open Finance.

*Priscilla Santos e Ingrid Pistili são sócia e associada, respectivamente, da prática de Bancário & Financeiro do escritório Tauil & Chequer



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